Como a Cardano é capaz de resistir a choques?
A Cardano está sendo construída como um sistema de missão crítica porque não deve falhar. Milhões, talvez um bilhão de pessoas podem um dia manter sua riqueza em Cardano. Isso exige muito da equipe IOG em termos de construção do sistema com cuidado e qualidade. Deve ser resiliente a eventos externos e resistir a choques. Uma falha fatal do sistema teria consequências negativas para todos os usuários, que poderiam ser economicamente arruinados. As pessoas dizem que o Bitcoin é antifrágil. Cardano também é antifrágil e capaz de resistir a choques? Quais características são importantes para a construção de um sistema resiliente?
TLDR:
- Coisas antifrágeis não são estáticas e imutáveis, mas sim capazes de se beneficiar de choques e se adaptar a novas condições.
- A Internet pode ser considerada um sistema resiliente, pois nunca teve uma falha fatal e está em constante aperfeiçoamento.
- Blockchain é uma tecnologia complexa. A qualidade geral do sistema deve ser julgado pela pior pontuação obtida para as propriedades selecionadas.
- Cardano é um sistema robusto. A questão é se é resistente.
O que é antifragilidade?
O termo antifragilidade foi cunhado por Nassim Taleb em seu livro “Antifragile: Things That Gain from Disorder”. Nassim inicialmente acreditava que o Bitcoin era antifrágil. Mais tarde, ele virou as costas para o Bitcoin. No entanto, parte da comunidade Bitcoin ainda acredita nessa narrativa.
Segundo Taleb, algumas coisas se beneficiam dos choques. Eles prosperam e crescem quando expostos à volatilidade, aleatoriedade, desordem e estresse. Eles adoram aventura, risco e incerteza. O autor do livro sobre antifragilidade percebeu a onipresença desse fenômeno e ficou incomodado com o fato de não haver uma palavra para o exato oposto de fragilidade. Ele começou a chamar isso de antifragilidade. Coisas frágeis desaparecem ou são substituídas. Coisas antifrágeis sobrevivem por séculos sem muita mudança.
Nassim Taleb escreveu em seu livro Antifrágil:
A antifragilidade está além da resiliência ou robustez. O resiliente resiste a choques e permanece o mesmo; o antifrágil fica melhor. O antifrágil ama a aleatoriedade e a incerteza, o que também significa — crucialmente — um amor pelos erros, uma certa classe de erros.
Uma característica fundamental da antifragilidade é a capacidade de mudar ao longo do tempo. Os exemplos dados por Taleb incluem cultura, sistema político, inovação tecnológica, sobrevivência corporativa, sistema legal, resistência bacteriana, etc. Coisas antifrágeis não são estáticas e imutáveis, mas sim capazes de se beneficiar de choques e se adaptar as novas condições.
Se for possivel definir as princiupais propriedades e métricas do sistema pelas quais podemos julgar a melhoria ou a deterioração, as propriedades das coisas antifrágeis devem melhorar com o tempo. Supondo que ocorram choques, as propriedades não devem apenas permanecer as mesmas, ou pior ainda, degradar.
Para entender a antifragilidade, é importante entender o significado dos termos robusto e resiliente. Uma analogia muito simples ajudará. Imagine que você está martelando em uma velha ponte de pedra. Este será um teste de resiliência da ponte. Veremos como a ponte supera esse choque. A principal característica que avaliaremos é a estática da ponte e sua condição original. A ponte tem valor histórico, por isso nos preocupamos que ela permaneça em sua condição original pelo maior tempo possível.
Uma coisa ou sistema é considerado robusto se mantiver indicadores de estabilidade e desempenho dentro de uma certa faixa tolerável sob condições de perturbação sem usar métodos adaptativos.
Se você começar a bater em uma ponte com um martelo, nada de sério provavelmente acontecerá em uma hora de seus esforços. Talvez a cobertura da superfície se solte ou você consiga arrancar algumas pedras da estrutura. Não terá um grande efeito na função da ponte. As pessoas continuarão a andar sobre ela e não perceberão nada. A ponte é capaz de suportar e sobreviver a marteladas de curto prazo. Em termos de valor histórico, os danos são pequenos e facilmente reparáveis. No entanto, a ponte está em piores condições do que antes do martelamento.
Uma coisa ou sistema é considerado resiliente se for capaz de resistir a interrupções severas dentro de parâmetros de degradação aceitáveis e se recuperar em um tempo aceitável.
Você convida seus amigos e martela a ponte com martelos pesados o dia todo. Você consegue derrubar um dos muitos pilares. A estática da ponte está comprometida. Você cairá de cansaço e, enquanto isso, os reparadores virão e construirão um novo pilar. A ponte será estruturalmente a mesma de antes, talvez até melhor graças aos materiais modernos que os reparadores usaram. A principal característica é a capacidade de superar rapidamente os danos e se adaptar a novas condições. O novo pilar não será tão fácil de quebrar com martelos. A estática da ponte permaneceu a mesma, ou pode até ser melhor. No entanto, em termos de valor histórico, a ponte sofreu graves danos.
Se fôssemos avaliar apenas a estática da ponte, poderíamos concluir que a ponte é resiliente, pois resistiu a choques pequenos e grandes. O novo pilar era melhor que o antigo. Sempre haverá uma equipe de especialistas prontos para reparar a ponte em casos semelhantes. O valor histórico da ponte sofreu em ambos os casos, então podemos dizer que a ponte é frágil ou, na melhor das hipóteses, robusta (a ponte tem muitos outros pilares originais). A avaliação geral seria que a ponte é frágil, pois você poderia pensar em muitas maneiras de destruí-la para sempre.
E se a ponte fosse antifrágil? Se esquecermos por um momento as leis da física e o valor histórico, podemos imaginar uma ponte que seria mais forte e resistente cada vez que um martelo a atingisse. Tal ponte seria capaz de suportar os elementos e qualquer carga. Provavelmente está claro para você que a humanidade (ainda) não conseguiu construir essa ponte. Por quê? Porque a ponte teria que se inovar de alguma forma. Não basta resistir ou adaptar-se, mas tornar-se melhor do que antes. Na próxima vez que você tentar bater na ponte com um martelo, nada acontecerá e talvez a ponte o acerte.
As redes blockchain podem ser antifrágeis?
Para que uma coisa seja antifrágil, não basta que ela resista a um choque ou se adapte a novas condições. O choque deve melhorar qualitativamente a coisa de acordo com métricas definidas. Alcançar tal estado no caso de qualquer rede blockchain é essencialmente impossível. Bitcoin definitivamente não é antifrágil. Esta afirmação é exagerada e é uma narrativa falsa.
Falamos de redes resilientes quando elas podem fornecer operação contínua e são altamente resistentes a interrupções. Se ocorrer um problema, a rede poderá continuar a fornecer serviços, independentemente da degradação, e uma correção rápida será possível.
A Internet pode ser considerada um sistema resiliente, pois nunca teve uma falha fatal e está em constante aperfeiçoamento. Durante a pandemia de COVID-19, o tráfego aumentou drasticamente à medida que as pessoas começaram a fazer streaming e usar mais videoconferências. O aumento no uso da Internet não causou nenhum problema. Agora a Internet está em uma fase evolutiva que chamamos de Web2. A tecnologia Blockchain tem o potencial de interromper o funcionamento da Internet. Referimo-nos a esse aprimoramento como Web3. Protocolos e serviços individuais estão desaparecendo para dar lugar a novos. Tudo está mudando e melhorando. A Internet permanecerá conosco para sempre. Segundo Taleb, a Internet é antifrágil?
No caso das redes blockchain, discutiremos não apenas a capacidade de se recuperar rapidamente de um ataque, mas também as propriedades que possuem um caráter a longo prazo. Por exemplo, diminuir gradualmente a descentralização ou o orçamento de segurança pode ser um processo de longo prazo e, no momento em que ocorre um ataque, a rede fica comprometida para sempre. Reputação e confiança são essenciais para os usuários.
As redes Blockchain são protocolos que usam a internet. No contexto do artigo, nos perguntamos se a Cardano é um sistema robusto ou resiliente. A resposta rápida seria que as redes blockchain existem há muito pouco tempo para saber a resposta. Sua adoção ainda é baixa, então os maiores choques ainda estão por vir. Se aceitarmos isso, podemos continuar nossa busca por uma resposta.
Cardano, Bitcoin e nenhuma outra rede blockchain descentralizada são antifrágeis. Muitas pessoas confundem o termo antifragilidade com longevidade. Eles argumentam que, se uma rede existe há tempo suficiente, ela deve ser antifrágil porque superou todos os obstáculos. Taleb define antifragilidade de forma diferente e fala sobre melhorar as coisas com base em choques. Os protocolos de rede só precisam ser robustos para existir por uma década ou mais.
Para redes blockchain, podemos observar várias propriedades no contexto da antifragilidade. Por exemplo, a imutabilidade da política monetária, descentralização, segurança, resistência à censura, escalabilidade, governança descentralizada, etc. Se escolhermos apenas a imutabilidade da política monetária, podemos concluir que quase todas as redes descentralizadas são resistentes a mudanças nas regras monetárias. Mas há um porém. Para fundamentar adequadamente essa afirmação, precisamos examinar coisas como a qualidade da descentralização e da segurança, a sustentabilidade de longo prazo do modelo econômico de muitos outros fatores. Blockchain é uma tecnologia complexa e, portanto, é importante considerá-la de forma holística ao avaliar a antifragilidade.
Pode acontecer que a política monetária seja de fato antifrágil, mas apenas se a descentralização da rede e o orçamento de segurança forem (pelo menos) robustos ou resilientes. No entanto, como em nosso exemplo de ponte, devemos perguntar se uma propriedade pode ser antifrágil se todas as outras propriedades do sistema não o forem. Assim, se a segurança é apenas robusta, devemos dizer com razão que a política monetária também é apenas robusta.
A qualidade geral do sistema deve ser julgada pela pior pontuação obtida para as propriedades selecionadas. Nenhuma propriedade deve ser deliberadamente omitida.
A Cardano é um sistema robusto ou resiliente?
Vamos primeiro definir os principais recursos importantes para a Cardano. No centro do projeto estão a descentralização e a segurança. Outras propriedades importantes são escalabilidade e sustentabilidade econômica de longo prazo. A qualidade das outras propriedades dependerá em grande parte das mencionadas acima.
As propriedades escolhidas são importantes no contexto dos choques que podem ser esperados no futuro.
Com base na experiência histórica, sabemos que a descentralização das redes blockchain tende a se degradar com o tempo. O Bitcoin era mais descentralizado antes do surgimento do hardware e pools ASIC. Agora, esta característica chave está estagnada ou degradada. Certamente não está melhorando.
A segurança pode ser vista de diferentes ângulos. A Cardano deve sobreviver a todos os ataques concebíveis, incluindo o de 51%. A equipe é responsável por analisar todos os vetores de ataque conhecidos e previsíveis e deve construir um sistema para resistir a esses ataques. Novos vetores de ataque podem surgir com o tempo. Algumas primitivas criptográficas podem se tornar obsoletas e precisam ser substituídas. Um dia será importante resistir à ameaça dos computadores quânticos. Do ponto de vista da descentralização, não é apenas a rede formada por pools e delegadores que é importante, mas também a equipe. Todo software requer manutenção e atualizações. Uma equipe capaz de inovar em tecnologia é parte integrante da segurança.
Toda rede blockchain precisa ter um orçamento de segurança suficiente e a capacidade de gerar receita. Somente a concessionária pode garantir a sustentabilidade econômica de longo prazo. No contexto da Cardano, isso está relacionado à escalabilidade. Todas as redes descentralizadas atuais (não estamos falando daquelas que não são descentralizadas) têm um problema de escalabilidade. Assim que o número de usuários aumenta, as redes deixam de ser capazes de lidar com o fluxo de transações. Este é um dos choques com os quais temos experiência histórica e é muito provável que ocorra novamente. A escalabilidade da Cardano deve melhorar e o utilitário deve crescer. Ninguém além da equipe fará isso.
Vamos pensar se a Cardano é robusta ou resiliente.
É justo contar a existência da rede apenas a partir da transição para PoS. A Cardano começou a usar esse consenso em 2020. Desde então, o número de pools cadastrados e o número de delegadores vem crescendo. Pode-se dizer que a descentralização está estagnada ou melhor, crescendo, mas certamente não está diminuindo drasticamente. No momento em que escrevo, o drama da Binance e FTX está em andamento e, mesmo assim, a descentralização da rede não está piorando. A aposta ao vivo é 0,5% maior que a aposta ativa. A segurança da rede Cardano esta amplamente ligada à descentralização. O declínio no valor de mercado das moedas ADA não é um choque tão grande para a segurança quanto para as redes PoW. Para esses, uma queda acentuada no valor da moeda pode forçar os mineradores a fechar suas instalações.
Em casos extremos, a Cardano é pelo menos robusta. Podemos dizer que também é resistente? O tema da descentralização é constantemente debatido na comunidade. Sugestões são feitas sobre quais parâmetros alterar para aumentar a descentralização, veja o debate sobre a alteração do parâmetro minPoolCost. Modificando o parâmetro K é teoricamente possível aumentar o número preferido de pools. A Cardano consegue adaptar-se a novas necessidades ou condições, pelo que podemos concluir que é resiliente.
Ninguém conseguiu comprometer a rede Cardano ou mesmo qualquer aplicativo descentralizado. A equipe da IOG publicou um estudo que analisa a capacidade de detectar o ataque de 51% e se recuperar autonomamente dele. Se esse recurso fosse implementado, a rede se aproximaria da resiliência.
Ouroboros Leios PoS melhorará significativamente a escalabilidade da Cardano. No momento, a rede não conseguiu lidar com o grande fluxo de usuários. Os usuários seriam forçados a tentar enviar transações várias vezes seguidas. A rede não travaria por causa disso (isso é testado), mas também não conseguiria atender a todos os pedidos dos usuários em tempo hábil. A rede agora é robusta. Assim que o Leios PoS for implementado, ele ficará melhor, ou seja, mais resiliente.
Maior escalabilidade, juntamente com outras inovações que aumentarão a utilidade, permitirá que a Cardano gere mais receita do que agora. A adoção é um fator importante. Sem que os usuários paguem pelos serviços, nenhuma rede tem chance de gerar receita. Além disso, o custo de execução de redes PoS é 99,9% menor do que as redes PoW, então a Cardano pode não ter um problema de orçamento de segurança tão grande quanto as redes PoW com um número limitado de moedas nativas.
Atualmente, a Cardano é robusta, pois as recompensas para operadores de pool e delegadores são retiradas da reserva (da expansão monetária) e isso pode funcionar por muito tempo. A Cardano será resiliente se gerar receita suficiente e não depender de moedas da reserva, que tem vida útil limitada (o número de moedas ADA é limitado).
Podemos concluir que a Cardano é um sistema robusto e pode ser resiliente em determinadas circunstâncias. Observe a importância da equipe, dos operadores de pool, dos delegadores e da comunidade. Pode-se esperar que certas propriedades se degradem com o tempo. Isso é mais evidente com a descentralização e o orçamento de segurança. Nenhum protocolo blockchain pode melhorar autonomamente essas propriedades. Depende sempre do comportamento das pessoas, mais especificamente da pressão da comunidade que vai pedir melhorias e da capacidade da equipa para melhorar as propriedades.
Observe que outros protocolos de Internet comumente usados não são tão dependentes da comunidade. Eles dependem apenas da equipe. Isso se deve ao fato de não serem descentralizadas e não dependerem de um modelo econômico.
Um sistema resiliente deve ser capaz de se recuperar de choques. Os recursos que podem ter sido degradados pelo choque devem retornar ao seu nível anterior ou até melhorar. Um ataque de 51% é um tipo de choque relativamente rápido e as redes devem suportá-lo para serem consideradas robustas. Se tal ataque ainda não ocorreu, o que é verdade tanto para a Cardano quanto para o Bitcoin, não sabemos realmente qual seria o resultado de tal ataque. Só podemos supor. O fato de não ter ocorrido um ataque pode ser considerado robustez.
Alguns choques podem ser um processo de longo prazo. No caso da descentralização, por exemplo, podemos acompanhar as tendências por um período mais longo e avaliá-las. Se esse recurso principal degradar com o tempo, o sistema não é robusto, mas frágil. A equipe, em colaboração com a comunidade, deve trabalhar duro para fazer melhorias. A degradação gradual pode resultar no fim do sistema.
Em geral, é difícil construir uma rede descentralizada que mantenha todas as propriedades iguais a longo prazo. As propriedades são mais propensas a mudar dinamicamente. Eles irão, em alguns casos, crescer, em outros casos, diminuir. Se um protocolo não muda e é estático, ele só pode ser robusto porque não é capaz de se adaptar a novas condições. No entanto, é possível que as condições mudem e a propriedade volte espontaneamente ao seu nível original. Sistemas resilientes precisam ser robustos, mas ao mesmo tempo capazes de adaptação. A adaptação pode exigir intervenção da equipe. Se o projeto tem governança descentralizada, e a Cardano está caminhando para isso, a intervenção da equipe pode ser considerada um ato centralizado.
Conclusão
Afirmar que a Cardano, mas talvez também o Bitcoin e outras redes, são um sistema robusto é um resultado muito bom. Alguns podem ficar desapontados com o fato de essas redes não serem antifrágeis. Tal sistema, pelo menos pela definição de Taleb, provavelmente não é possível construir com o conhecimento atual da tecnologia. Em nossa opinião, a Cardano tem chance de se tornar um sistema resiliente. Para afirmar isso com maior grau de certeza, precisaríamos conduzir uma análise muito mais profunda.
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Artigo Original - How is Cardano able to withstand shocks? | Cardano Explorer